Quem me conhece pessoalmente sabe que eu não sou adepta do uso de medicamentos, acredito que o corpo é capaz de se curar sozinho e que o processo da doença é uma ação que joga para fora coisas ruins que estão dentro do corpo, além de achar que os efeitos colaterais vindos das medicações em geral são um preço muito alto para se pagar. Isso não significa não ir ao médico, é apenas uma opção de tratamento. Saber o que está acontecendo é essencial para ser capaz de tomar essa decisão. Como falei (e recomendei alguns) no post da semana passada, ser acompanhado por um otorrino especializado em voz cantada é fundamental para um cantor. Apesar do que disse acima, com uma agenda profissional intensa, nem sempre consigo dar ao meu corpo esse tempo para se curar. Hoje, então, falarei sobre o efeito de alguns medicamentos na voz.
Infelizmente o mundo lírico é permeado pela hipocondria (normalmente aumentada pela técnica de canto deficiente, que causa insegurança), a auto-medicação e a susceptibilidade exarcerbada às indicações de colegas que parecem sempre possuir uma fórmula milagrosa que pode ajudar a voz (leia mais sobre o dopping no mundo lírico aqui). O melhor é sempre a auto-observação para avaliar o que acontece no seu corpo (os efeitos sempre são pessoais, cada organismo é único) em particular e pedir orientação do seu médico em relação aos possíveis efeitos colaterais das medicações. Relate para ele todos os sintomas diferentes que sentir no seu corpo e, acima de tudo, seja totalmente sincero em relação a quando e o que pretende cantar (lembre-se de que um otorrino que não seja especialista em voz cantada pode te orientar erradamente por não entender exatamente o ato de cantar, procure um especialista e conte a ele todos os remédios que estiver tomando, mesmo os que não são relacionados à voz). Informe também seu professor de canto se você está sob efeito de medicações, ele pode ajudar a perceber os efeitos que apareceram no seu corpo e também a lidar com esses sintomas caso suspender a medicação não seja uma opção.
Anti-inflamatórios, antibióticos e anti-alérgicos:
É comum pessoas sentirem dificuldade de controle muscular, sonolência ou dificuldade de concentração ao tomar anti-inflamatórios e/ou anti-alérgicos (anti-histamínicos). É necessário particular atenção para remédios aspirados que terão contato direto com o aparelho fonador. Antibióticos podem causar diversos efeitos colaterais também, os mais comuns não afetam o canto, mas observe-se para ver como o seu corpo reage e (como estou imaginando que você só está tomando esses medicamentos com orientação médica) fale com o seu médico. Alguns anti-inflamatórios: Diclofenaco, Ibuprofeno, Naproxeno, Nimesulida, Indometacina, Cetoprofeno, Acido mefenâmico, Piroxican, Colecoxib, AAS (ácido acetilsalicílico), etc. Lembrando que cortisona é um anti-inflamatório. Alguns anti-alérgicos: Zyrtec, Hexal, Hixizine, Hixilerg, Alergaliv, Desalex, Claritin, Agasten, Emistin, Airclin, Nasocort, Caladryl, Defenidrin, Allegra, Allexofedrin, Altiva, etc
Anestésicos locais:
Em hipótese alguma cante sob o efeito de anestésicos locais, isso fará com que você não sinta o que está acontecendo na sua garganta e pregas, dificultando o seu controle e eliminando qualquer possível dor, que é como o corpo avisa que algo não está bom.
Muitas pastilhas para garganta tem efeito anestésico, preste atenção aos seus componentes. Alguns anestésicos locais: Lidocaína ou Xilocaína, Procaína, Tetracaína, Bupivacaína, Mepivacaína, etc.
Spray de própolis (e outras misturas que levem própolis, seja ele direto, misturado com mel ou xaropes) e Halls preto (ou qualquer outra bala que cause “aquela sensação de ultra-frescor”) também têm leve efeito de anestesia local, não cante ao consumi-los.
Relaxantes musculares:
Cantar sob o efeito de relaxantes musculares também não é legal. Os músculos estarão mais “relaxados”, o que significa que não estarão respondendo da mesma forma que o normal, podendo causar desde um simples descontrole na técnica até um machucado nas pregas por uso errado da voz (por falta de suporte respiratório, já que os músculos não estarão respondendo corretamente). Raras vezes relaxantes musculares são tomados por doenças no aparelho fonador, então fique atento quando tomar por outras razões. Alguns relaxantes musculares são Dorflex, Miosan, Torsilax, Tandrilax, Mioflex A, Ciclobenzaprina… (medicamentos para cólica menstrual costumam ser fortes relaxantes musculares).
Calmantes, remédios anti-ansiedade e remédios para dormir:
São grandes vilões em relação à voz, causam como efeitos colaterais moleza muscular (inclusive nas próprias pregas vocais), vagareza no raciocínio, tremedeira, entre outros. Além dos efeitos interferirem no controle corporal, dificultando a correta execução técnica, eles podem afetar a própria voz, alterando seu som. Infelizmente a necessidade de dormir horas suficientes e a pressão da carreira fazem esses remédios serem muito consumidos no meio lírico, mas minha recomendação é de não tomá-los pelo menos 48 horas antes de uma performance (esses remédios demoram 24 horas para sair do organismo pelo menos), mas claro que a avaliação dos prós e contras deve ser feita por você em relação ao seu cálculo. Outro agravante deste consumo é que normalmente são remédios prescritos por médicos que não entendem nada de voz, portanto informe seu otorrino especialista quando for consumi-los. Alguns remédios nessa categoria: Valium ou Diazepam, Clonazepam ou Rivotril (pelo grande consumo desse remédio confesso muitas vezes identificar um cantor que está tomando esse remédio pelo som que fica na sua voz), Lorazepam ou Lorax, Buspirona ou Bespar, Alprazolam ou Frontal, Fluoxetina ou Prozac, etc.
Remédios com cafeína:
Muitos remédios para dor de cabeça e anti-gripais contém cafeína. Leia mais sobre os efeitos da cafeína aqui.
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Muito importante considerar a saúde. Gostaria de citar seu texto na página de meu Face Letramento em Saúde, se você autorizar.
Claro que autorizo! 🙂