Nosso leitor F. Pereira me pediu para escrever sobre registros vocais e ressoadores. (Tem alguma sugestão de tema também? Deixe-a aqui!).

São temas realmente essenciais para o canto e também muito vastos, que com certeza ocuparão vários e vários posts. Então, hoje, começarei a abordar o tema dos ressoadores.

A primeira coisa a entender sobre esse tema é:  para que servem os ressoadores? Eles são nossos amplificadores naturais. Comparando com um instrumento elétrico, digamos que o ar seja a energia elétrica, a corda vocal seja o instrumento (uma guitarra por exemplo) e que os ressoadores sejam o amplificador. Você pode se perguntar se essa comparação não seria um pouco absurda já que uma guitarra desconectada não produz som nenhum, mas é exatamente assim, as pregas vocais sem sua fonte de energia, o ar, e sem seus amplificadores, os ressoadores, também não produziriam som nenhum.

Compreendida a importância dos ressoadores é necessário entender quem eles são. Segundo Sundberg:

“Everything that possesses the properties of mass and compliance is a resonator.”¹

Acho esse conceito maravilhoso, pois deve-se cantar com o corpo todo e usá-lo completamente como uma fonte de ressonância. Mas, do ponto de vista das ações físicas necessárias para o canto, é preciso sair um pouco deste campo mais filosófico e entrar no fisiológico propriamente dito. Dividirei então os ressoadores em dois grupos: os passivos (que vibram ao longo de todo o corpo sem a ação direta do executor e que interferem muito pouco na nossa qualidade sonora propriamente dita, definindo mais nuances de timbre característico de cada um) e os ativos (usados com consciência pelo cantor).

Uma das coisas sobre as quais é mais importante ter clareza no estudo dos ressoadores é a noção de que todos eles ressoam por consequência da movimentação feita na laringe. O que difere os ressoadores passivos dos ativos é que movimentos de articulação, bloqueio ou relaxamento nos ressoadores ativos interferem diretamente na produção sonora que ocorre na laringe e também na possibilidade de ressonância nos ressoadores passivos. Deixarei então de lado os ressoadores passivos, como o seio frontal e o seio esfenoidal por exemplo, e me concentrarei nos ressoadores ativos, chamando-os de agora em diante apenas de ressoadores.

Separei dois trechos de livros interessantes que abordam essa questão de forma bem clara e fisiológica:

“Nous le verrons, les trois grands résonateurs de la voix sont la cavité rhino-pharyngée, le vestibule laryngé et les cavités nasales, que, elles, sont situées au-dessus du palais. Tous ces résonateurs amplifient les vibrations émises par les cordes vocales. Plus ces résonateurs sont libres et ouverts, plus les vibrations viennent se répandre dans les cavités osseuses et cartilagineuses que sont les sinus maxillaires et frontaux. On pete avoir alors l’ilussion que les résonateurs sont dans la face, mais cela est inexact pour les raisons citées plus haut.” ²

“The facial vibration is indeed the result, not the cause of laryngeal vibration, still not an illusion. Any articulation at all or blockage of the head cavities greatly affect the quality of laryngeal vibration (vocal cords).

What happens above the vocal folds is the most secure indicator of what is happening to them. Manipulation of the palate, tongue, and nasalis alter the length and shape of the tube or resonating spaces of the human instrument therefore the vibrations of the vocal folds respond to this change with the quality of vibration.”³

Podemos listar os ressoadores da seguinte forma:

Ressoadores abaixo do Palato:

  • Nasofaringe;
  • Vestíbulo da laringe;

Ressoadores acima do Palato:

  • Corneto inferior da cavidade nasal;
  • Corneto médio da cavidade nasal;
  • Corneto superior da cavidade nasal;

Para usá-los usamos a movimentação:

Continuarei o aprofundamento neste tema nos próximos posts mas antes gostaria de deixar claro mais uma divisão no estudo dos ressoadores.

Para um estudante de canto lírico existem dois segmentos de estudo diferentes e separados, sobre os quais é preciso muita clareza. O primeiro é o estímulo aos ressoadores e o segundo é o domínio técnico do seu uso. O segundo é chamado, na pedagogia do canto, de estudo de “posição”, podemos definir a “posição no canto” como o conjunto das movimentações físicas necessárias para o uso correto dos ressoadores.

Já o estímulo dos ressoadores é indicado no caso de que o aluno não tenha todos eles devidamente estimulados ou abertos (compare com um instrumento de cordas que ao ser recém feito necessita ter seu som “aberto”). Cada indivíduo é totalmente único e tem alguns ressoadores estimulados e outros não, ou até todos já “abertos” ou mesmo nenhum estimulado. Isso pode e deve ser corrigido com a ajuda de um professor experiente que tenha uma excelente audição capaz de identificar a particularidade de cada estudante e orientá-lo com os exercícios corretos para tal estímulo.

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¹ “Tudo o que possui as propriedades de massa e de complacência é um ressoador.” (Tradução Livre)  – SUNDBERG, Johan. The Science of the Singing VoicePaperback , 1989. (Esse livro saiu em português em 2015 pela EDUSP)
² “Vamos ver, os três ressonadores da voz são a cavidade nasofaríngea, o vestíbulo da laringe e as cavidades nasais, que estão localizadas acima do palato. Todos estes ressoadores amplificam as vibrações das cordas vocais. Quanto mais esses ressoadores estiverem livres e abertos, mais vibrações estarão espalhadas nas cavidades ósseas e nas cartilagens que são os seios maxilares e frontais. Uma pessoa pode ter a ilusão que os ressoadores estão no rosto, mas isso não é verdade pelos motivos citados acima.” (Tradução Livre) – BLIVET, Jean-Pierre. La Voie du Chant – Traté de technique vocale. França: Librairie Arthème Fayard, 1999.
³ “A vibração facial é de fato o resultado, não a causa da vibração da laringe, ainda assim não é uma ilusão. Qualquer articulação ou bloqueio das cavidades da cabeça afeta muito a qualidade de vibração da laringe (cordas vocais). O que acontece acima das pregas vocais é o indicador mais seguro do que está acontecendo com elas. Manipulação do palato, da língua, e dos músculos nasais altera o comprimento e a forma do tubo de ressonância ou dos espaços do instrumento humano, portanto, as vibrações das cordas vocais respondem a essa alteração com a qualidade da vibração.” (Tradução livre) – JACOCKS, Kendrick . Anatomy of Bel Canto: Stroke of the Mask, Chest Support, and Proof for the Ancient Method. Paperback, 2007.

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