No post da semana passada fiz um esquema geral de como divido o estudo da técnica para melhor aproveitamento pedagógico. Nele falei das 5 partes do corpo (estruturas) que devem ser deliberadamente movidas para que a posição para cantar seja correta, são eles: as pregas vocais, a laringe, os zigomáticos, o palato e a língua. No post de hoje falarei sobre a língua.

Compreensão mental

O que é mais importante entender sobre a língua é que, além de parecer ter vontade própria, ela é extremamente prestativa, está sempre querendo “ajudar” e se meter em tudo que acontece em torno dela. Quem nunca, ao ter algo no dente, sentiu que a língua simplesmente não podia não ir lá averiguar o que estava acontecendo?

Essa condição prestativa da língua também aparece ao cantar e é muito comum que a língua faça movimentos estranhos e principalmente tensos nesta hora.

A língua deve ficar relaxada, espalhada e corretamente posicionada durante o canto, saindo desse lugar apenas durante as consoantes. Nas vogais ela deve fazer pequenos movimentos sem deixar esta posição, e sem em nenhum momento ficar tensa, porém sua total frouxidão também não é desejada. Para saber se ela está espalhada pela boca é importante observar o seu contato com a parte interna dos dentes inferiores, tanto na parte da frente como nas laterais.

Compreensão física

A língua é um conjunto de músculos (8 no total, sendo 4 intrínsecos e 4 extrínsecos) muito maior do que normalmente pensamos. Pela imagem acima é fácil perceber que uma grande parte da língua fica bem para dentro e não é visível para nós. no entanto, mesmo não podendo vê-la completamente, podemos senti-la. Para isso, é necessário tomar conscicência de até onde ela chega. Faça o seguinte exercício: passe a língua de forma circular na parte de fora dos dentes continuamente. Com algumas voltas você já começará a sentir um calor e um cansaço na região acima da sua laringe, essa sensação é exatamente na base da língua.

Tendo agora consciência de até onde vai a língua, é a hora de posicioná-la de forma não tensa. A ponta da língua deve tocar a parte de trás dos dentes incisivos inferiores e ela deve se espalhar por toda a boca tocando também nas laterais a parte interna dos dentes inferiores.

“Per cantare è indispensabile una grande mobilità della mascella e della lingua, pertanto ocorre per prima cosa una presa di conscienza delle proprie possibilità di apertura.

1. Appoggiare gli indici nella congiunzione delle due mascelle.
2. Appoggiarde morbidamente la ponta della lingua alla base degli incisivi inferiori.
3. Aprire e chiudere elasticamente la bocca più volte.

L’esecuzione di questo esercizio porta ad una correta postura della lingua.” ¹

É importante nesse momento perceber outra característica importante em relação à língua: cada um tem uma língua de um tamanho. Diferenças de tamanho podem alterar levemente essa posição dada acima, línguas muito grandes por exemplo podem ter que virar a ponta da língua para baixo, fazendo com que uma parte um pouco mais atrás da ponta em si toque os incisivos inferiores. Para achar esse correto posicionamento em relação à sua anatomia pessoal, sempre recomendo o acompanhamento de um bom profissional de canto.

Por razões didáticas nesse primeiro momento focarei no relaxamento da língua, pois sua tensão costuma estar presente na maioria dos estudantes de canto. Somente ao retirar esse excesso de tensão será possível ajustar o tonus ideal da língua e seu posicionamento. Nesse primeira fase então falarei bastante sobre esse relaxamento ignorando, por hora, o tonus ideal, de que falarei mais adiante.

Depois de encaixada ela também tem que estar relaxada. Para conseguir alcançar o relaxamento desejado pode-se usar a observação visual da língua em um espelho e a propriocepção (que já começou a ser trabalhada no exercício de girar a língua na boca). Com o uso de um espelho, observe se a língua não se afina ou se eleva de forma que perca o contato com os dentes tanto frontais quanto laterais, se isso ocorrer é sinal de que ela está tensa e deve ser relaxada.

Para usar a sua propriocepção² você tem que encontrar a sensação que indica que a língua está relaxada e depois procurar mantê-la ao cantar. Para isso faça o seguinte exercício: com uma gaze segure a ponta da sua língua. Relaxe-a então na sua mão e averigue se realmente não há mais tensão. Fixe então a sensação naquela região identificada pelo exercício de girar a língua na boca e então volte-a para dentro da boca e posicione-a corretamente procurando manter essa sensação de relaxamento da sua região mais interna.

Se ao posicionar a língua na posição correta a sensação de relaxamento da base da língua não estiver presente, pode ser um sinal de que sua língua é grande e ajustes deverão ser feitos para encontrar a melhor posição para ela. Tenha em mente que a posição correta facilita o relaxamento.

Compreensão emocional

Línguas tensas e que tendem a resistir a ficar na posição correta são habituadas a este erro. Para mudar isso é necessária muita paciência consigo mesmo. Lembre-se de que hábitos podem ser mudados, mas que isso requer um treino constante por vários dias seguidos (leia mais sobre isso aqui) e muita, muita, muita paciência. Não brigue com a sua língua, ela ficará ainda mais rebelde. 😉

Continue lendo sobre esse assunto no post Voltando a falar sobre a língua.

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¹ “Para cantar é indispensável uma grande mobilidade da mandíbula e da língua, para isso é necessário primeiro uma tomada de consciência da própria possibilidade de abertura. 1. Apoie os indicadores na junção do maxilar com a mandíbula. 2. Apoei suavemente a ponta da língua na base dos dentes incisivos inferiores. 3. Abra e feche elasticamente a boca várias vezes. A execução deste exercício leva a um correto posicionamento da língua.” (tradução livre) – CASTELLANI, Adriana. Vivere in Armonia. Abano Terme: Francisci Editori

² Propriocepção também denominada como cinestesia, é o termo utilizado para nomear a capacidade em reconhecer a localização espacial do corpo, sua posição e orientação, a força exercida pelos músculos e a posição de cada parte do corpo em relação às demais, sem utilizar a visão. (Fonte: Wikipédia)